
A Quaresma se aproxima e católicos por todo mundo estão assumindo diferentes formas de jejum e abstinência, em preparação para a semana mais sagrada do ano. Mas por que jejuamos? Como dizer não à comida ou a outros prazeres corporais nos faz, efetivamente, amar mais a Deus?
O jejum cristão não está fundamentado em suspeitas relacionadas à rejeição do mundo físico, do corpo humano ou dos prazeres alimentares, é exatamente o oposto. Somente aqueles que sabem jejuar corretamente sabem festejar. Nós jejuamos, antes de tudo, diz o catecismo, para “nos prepararmos para as festas litúrgicas” (CIC 2043).
O jejum nos permite sentir nossa fome. E sentir nossa fome física pode, se permitirmos, nos levar a sentir nossa fome espiritual – nossa fome de Deus. Pense na mulher no poço: ela chegou lá com sede física e saiu com a promessa de “água viva”.
Se sentir nossa fome pode despertar nossos sentidos espirituais, nunca sentir fome pode entorpecê-los. Além disso, quando sempre satisfazemos nossa fome, nós podemos nos tornar escravizados pelos prazeres deste mundo. Jejum e abstinência “nos ajudam a adquirir domínio sobre nossos instintos e liberdade de coração” (CIC 2043). Esse tipo de liberdade é especialmente importante para pessoas que, como eu, amam comer.
Ah, e como eu amo! Na verdade, no final de uma refeição, muitas vezes sinto uma profunda tristeza. Às vezes, me vejo pegando as menores migalhas do meu prato na tentativa de esticar o prazer até que o último pedaço desapareça. Mas estou apenas adiando o inevitável. Esta refeição vai acabar. Vai acabar! Mais uma migalha e acabou. Terminado. Fim. Algo em mim grita: Não! Eu quero que isso dure para sempre…
E aí está — meu anseio pelo infinito… meu anseio por Deus. A tristeza que sinto ao final de uma refeição me deixa com três escolhas: posso voltar e comer mais comida do que preciso (Gula); posso rejeitar o prazer da comida como um mal (estoicismo, puritanismo, maniqueísmo); ou posso permitir que a “dor” que sinto me abra para a esperança viva do Banquete Eterno. O jejum bem praticado, é precisamente uma porta aberta a essa esperança
Deus deseja nos alimentar com “alimentos suculentos e ricos e vinhos puros e selecionados” (Is 25, 6), com “pão que desceu do céu” (Jo 6, 41). As escrituras descrevem o céu como um banquete – Um banquete nupcial (Ap 19, 9). E não nos esqueçamos do primeiro milagre de Cristo: ao final da festa, quando os convidados do casamento já haviam terminado o vinho, Cristo fornece 150 galões do melhor vinho imaginável. Como a glória de Pentecostes indica, todos nós somos chamados a nos “embriagar” com este vinho novo (veja Atos 2,13).
Esse tipo de “embriaguez sagrada” é um dos temas favoritos dos místicos. No Cântico dos Cânticos, o Rei convida sua noiva para a “adega” (Ct 1,4). Teresa de Ávila comenta: “O rei parece não recusar nada à Noiva! Pois bem, então, deixe-a beber o quanto quiser e embriague-se com todos esses vinhos na adega de Deus! Deixe-a desfrutar dessas alegrias, maravilhe-se com essas grandes coisas e não tema perder a vida bebendo muito mais do que sua natureza fraca lhe permite fazer. Deixe-a morrer finalmente neste paraíso de delícias; morte abençoada que faz viver de tal maneira.”
Uau! Se o jejum cristão autêntico serve para me preparar para esse tipo de banquete, então manda ver! Mas podemos perguntar: qual é a diferença entre esse tipo de “indulgência sagrada” e o bong de cerveja na festa de fraternidade? É o seguinte: tornamo-nos glutões e bêbados quando buscamos a satisfação de nosso desejo pelo Infinito no vinho da terra, mas nos tornamos santos quando buscamos a satisfação de nosso desejo pelo Infinito no vinho do céu.
Devemos, então, rejeitar o vinho da terra? Não! Esse é o erro essencial do puritanismo e do maniqueísmo – a ideia de que o mundo físico e seus prazeres são maus. Não, eles não são maus. Devidamente abraçados, eles são “pequenos sacramentos”, pequenos vislumbres do céu.
Como, de fato, Deus nos comunica o vinho do céu? Precisamente através do vinho da terra: “Bendito és Tu, Senhor Deus de toda a criação, porque por tua bondade recebemos o vinho que te oferecemos: fruto da videira e trabalho das mãos humanas, ele se tornará nossa bebida espiritual”. Mas, para entrar nas delícias infinitas deste banquete litúrgico, precisaremos aprender a jejuar.
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Autor: Dr. Christopher West
West se formou na Lancaster Catholic High School em 1988. Ele recebeu um Bacharelado em Antropologia em 1992 pela Universidade de Maryland. Em 1996 foi certificado como Instrutor de Preparação para o Matrimônio pela Arquidiocese de Washington, e tornou-se Catequista Certificado pela Escola Catequética da Arquidiocese de Denver. Ele também recebeu um doutorado honorário da Universidade DeSales. Em dezembro de 2019, West recebeu o título de Doutor em Teologia pela Pontifex University, com sede em Atlanta, GA. Fundador do TOB Institute e um dos professores mais reconhecidos do mundo da Teologia do Corpo de São João Paulo II. De todos os seus títulos e papéis, no entanto, ele tem mais orgulho de se chamar de marido e pai dedicado.
Fonte: TOB INSTITUTE Blog
Traduzido por Laíse Abreu Barbosa – Membro da Rede de Missão Campus Fidei, servindo no Núcleo de Comunicação, além de atualmente participante do Núcleo de Música e Coordenadora do Grupo de Estudos YOUFAMILY (2025-2026) em Brasília – DF.