A quinta-feira da Ascensão¹ é uma das festas mais gloriosas e cheias de esperança do calendário litúrgico da Igreja. E 10 dias depois dela, nós vamos celebrar Pentecostes. Nenhuma das duas festas pode ser entendida sem a outra e nenhuma delas pode ser compreendida a menos que tenhamos um entendimento teológico apropriado do corpo humano.
No seu belo, e surpreendente livro, O Mistério Nupcial, Cardeal Angelo Scola, Arcebispo de Milão, escreveu:
“Eu acredito que uma das mais sérias tentações que assediam os cristãos atualmente é o espiritualismo. O que eu quero dizer que é muitas vezes não intencionalmente, mas, ainda assim é algo sério, a maneira com que algumas pessoas têm um olhar sobre a Ascensão de Cristo como uma desencarnação. É bastante comum”, Angelo continua, “mesmo entre os cristãos, encontrar a crença prática de que, no fim das contas, a existência de Cristo não se faz materialmente presente no aqui e agora. Jesus Cristo… é tratado como um fato do passado!”
Existem muitos pontos importantes para se descobrir nas observações do Cardeal Scola. Primeiro, muitos de nós estamos propensos ao “espiritualismo”. Nós temos inadvertidamente “desencarnado” ou “escarnado” o mistério cristão. Muito de nós consideramos que “santidade” envolve viver uma vida “espiritual” separada dos nossos corpos. A espiritualidade cristã, a santidade cristã, é sempre uma espiritualidade encarnada, uma santidade encarnada.
Separar a nossa vida espiritual da nossa vida corporal é tornar a encarnação de Cristo sem sentido algum em nossas vidas. Quando São Paulo diz “deixai-vos conduzir pelo Espírito, e não satisfareis os apetites da carne.” (cf. Gl 5, 16-26), ele não está dizendo que devemos rejeitar os nossos corpos em favor do espírito. Ele está falando que nós devemos acolher intimamente o Espírito Santo em nossos corpos para que o que nós fizermos com os nossos corpos seja inspirado por Deus. Nós somos chamados a encarnar a vida de Deus. Nós somos chamados a oferecer os nossos corpos para Deus como um ato espiritual de adoração (cf Rm 12).
Cristo se encarnou para redimir os nossos corpos. Cristo ressurgiu dos mortos corporalmente e ascendeu para a glória nos céus corporalmente para que toda nossa humanidade encarnada possa ser levada junto com Ele para a vida eterna da Trindade. E essa é a conexão essencial entre a Ascensão de Cristo e Pentecostes. Cristo nos disse que a descida do Espírito Santo dependia da ascensão ao Pai. “Entretanto, digo-vos a verdade: convém a vós que eu vá! Porque, se eu não for, o Paráclito não virá a vós; mas se eu for, vo-lo enviarei” (Jo 16,7). Cristo teve que levar nossa humanidade para a vida da Trindade para que nós pudéssemos partilhar dessa vida, que é o que Pentecostes significa.
Um dos meus professores da faculdade uma vez explicou que Pentecostes não é tanto sobre a descida do Espírito Santo sobre nós, mas um sinal certo de que em Cristo nossa humanidade encarnada já havia sido elevada para a vida da Trindade. Pentecostes – nossa participação na vida do Espírito Santo – é o efeito, portanto, da ascensão corporal de Cristo ao céu. Por causa de Pentecostes, o Catecismo diz que todos os que acreditam em Cristo “participam já na comunhão da Santíssima Trindade” – e nós participamos “na humildade da carne” (CIC 732).
Como o Cardeal Angelo Scola observou, quando desencarnamos a Ascensão de Cristo, Jesus se torna um mero evento do passado. Ele não tem como estar materialmente presente para nós aqui e agora. A ascensão corporal de Cristo, por outro lado, permite que Ele esteja materialmente presente para nós aqui e agora. Como? Através do envio do Espírito Santo que, assim como o Espírito encobriu Maria para tornar realidade o mistério da Encarnação, continua a comunicar a presença corporal de Cristo para nós no mistério dos sacramentos da Igreja.
As realidades corporais e físicas dos sacramentos comunicam a realidade Espiritual última para nós. Essa é a lógica do Cristianismo, que é a lógica da Encarnação, trazida para nós por cortesia da Ascensão corporal do Senhor e da descida do Espírito Santo em Pentecostes.
N.T.: Em alguns países, como nos Estados Unidos, celebra-se a Ascensão 40 dias depois da Páscoa na quinta-feira. Já em outras regiões, como o Brasil, a festa é celebrada no domingo seguinte a quinta-feira da Ascensão.
Autor: Christopher West
Fonte: Cor Project
Traduzido por Angela de Oliveira – Membro da Rede de Missão Campus Fidei