A Eucaristia, nosso alimento para a jornada

Por que recebemos a Eucaristia? Para alguns, essa pode ser uma pergunta boba. É o corpo e o sangue de Jesus, então por que não a receberíamos? Porém, não acredito que a questão seja assim tão simples. Sim, é excelente ter Deus fisicamente presente entre nós, mas por que querer comer e beber dessa presença? O que se alimentar do corpo e do sangue de Jesus faz exatamente conosco? Esse é um questionamento ainda mais profundo a ser respondido e, neste artigo, quero ver como a Bíblia o responde. Especificamente, eu quero ver o que Jesus disse sobre a importância da Eucaristia em nossa vida interior. 

Para a Salvação do Mundo 

Muitos católicos estão familiarizados com o sexto capítulo do Evangelho de São João. Nele, Jesus dá um sermão que os estudiosos chamam de “Discurso do Pão da Vida”, e ele (particularmente nos versículos de 51-58) é frequentemente usado na apologética para demonstrar que a Eucaristia é verdadeiramente o corpo e o sangue de Jesus. Ele repetidamente diz a seus discípulos que eles devem comer sua carne e beber seu sangue, claramente confirmando a crença católica de que a Eucaristia não é um mero símbolo.

Entretanto, esse sermão nos ensina mais do que o puro fato da presença real de Jesus, ele também nos diz sobre a função que a Eucaristia deve ter em nossa vida interior. Em particular, uma coisa que Jesus diz dela está repleta de significado:

“Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão, que eu hei de dar, é a minha carne para a salvação do mundo” (Jo 6, 51).

Quando lemos as palavras de Jesus sobre sua carne sendo dada “para a salvação do mundo”, muitos de nós O compreendem estar se referindo à Sua morte pelo sacrifício. Na cruz, Jesus deu sua vida, sua carne, para redimir o mundo inteiro (1Jo 2, 1-2), e Ele nos dá a mesma carne na Eucaristia. Porém, eu sugeriria que aqui há mais do que os olhos podem ver. Sim, Jesus está se referindo à Sua morte, mas Suas palavras têm um significado mais profundo também, um que nos diz mais sobre o papel de como a Eucaristia deve tocar em nossa vida interior.

O Novo Maná

Se voltarmos e lermos esse versículo em contexto, podemos ver que o Discurso do Pão da Vida foi induzido por um breve diálogo que Jesus teve com a multidão. Nesse diálogo, o povo questiona-O sobre que sinal Ele faria para que cressem que Ele vinha de Deus, e citam o maná, o pão milagroso do céu que sustentou os israelitas enquanto viajavam para a Terra Prometida, depois do Êxodo do Egito (a história é narrada em Ex 16, 1-36), como um exemplo do tipo de sinal que eles aguardavam (Jo, 6, 30-31). Em resposta, Jesus lhes diz que o maná prefigurou o “verdadeiro pão do céu”, que Deus mais tarde daria a seu povo (Jo 6, 32), e inicia Seu Discurso do Pão da vida, o qual explica que Ele mesmo (e ultimamente Seu corpo e sangue na Eucaristia) é o “pão descido do céu” (Jo 6, 41.51).

Nesse contexto, podemos ver que quando Jesus diz que sua carne é dada “para a salvação do mundo” na Eucaristia, Ele quer dizer que sua carne é o novo maná, o “verdadeiro pão do céu” que é capaz de sustentar todos nós na nossa jornada à nossa pátria celestial, assim como o maná no Antigo Testamento alimentou os israelitas na jornada à Terra Prometida. Porém, isso levanta uma pergunta. Como exatamente a Eucaristia nos sustenta espiritualmente? O que realmente significa dizer que a Eucaristia é o alimento para nossa jornada ao céu?

Vida Eterna

No restante do Discurso do Pão da Vida, Jesus nos dá algumas dicas para respondermos essas questões. Primeiro, Ele nos diz:

“Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia (Jo 6, 53-54).

Nessa passagem, Jesus nos ensina que a Eucaristia literalmente sustenta nossa vida interior. Sem ela, como Ele diz, nós não temos “vida [espiritual] em nós mesmos”. Em outras palavras, ela ajuda a sustentar a vida de graça em nós, a graça que recebemos no Batismo e que cremos que irá frutificar em vida no céu quando morrermos, assim como o alimento terreno sustenta nossa vida física. Mais especificamente, como o Catecismo da Igreja Católica explica, a Eucaristia “conserva, aumenta e renova a vida da graça”, “afasta-nos do pecado” e “preserva-nos dos pecados mortais futuros”. (CIC 1392, 1393, 1395)

Permanecendo em Cristo

Em segundo lugar, Jesus nos diz que “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele” (Jo 6, 56). Agora, esse versículo é interessante porque é o oposto do que esperamos que Ele diga. Esperaríamos que Jesus dissesse primeiro que a Eucaristia permite que Ele permaneça em nós (afinal, nós O recebemos neste sacramento, não o contrário) e somente depois dissesse que ela permite que permaneçamos Nele, mas não é o que Ele faz. Não, ele muda a ordem, implicando que nossa presença Nele é mais importante que Sua presença em nós.

Mas o que isso significa? Como podemos permanecer em Jesus? Ele não responde a pergunta no Discurso do Pão da Vida, mas Ele retorna a esse fio solto mais tarde no Evangelho de João, e sutilmente explica o que quer dizer:

“Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer. Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora, como o ramo. Ele secará e hão de ajuntá-lo e lançá-lo ao fogo, e será queimado” (Jo 15, 5-6).

Hoje, a conexão entre essas duas passagens é obscurecida um pouco em algumas traduções. No Discurso do Pão da Vida, Jesus diz que a Eucaristia nos permite “permanecer” Nele, e em outros diz que podemos “ficar” Nele. São dois verbos diferentes, mas no grego eles de fato são a mesma palavra. Consequentemente, para os leitores originais de João, a conexão seria muito clara.

E o que precisamente é essa ligação? A Eucaristia nos permite “permanecer” ou “ficar” em Jesus, assim como os ramos permanecem na videira. Da mesma forma que a videira dá vida a seus ramos e permite-lhes crescer e frutificar, a Eucaristia nos conecta à fonte da vida interior, Jesus, nos permitindo crescer e frutificar espiritualmente. Nos permite dar frutos por Deus, obedecendo às suas leis e seguindo sua vontade em nossas vidas, e sem ela, não podemos cumprir nossas vocações ou viver uma vida católica fiel. Em poucas palavras, este sacramento nos liga à fonte de toda graça e santidade, e quanto mais o recebemos, mais forte essa conexão se torna.

Alimento para a Jornada

Então da próxima vez que você for à Santa Missa e receber a Comunhão, se recorde que você não está somente cumprindo um ritual religioso arcaico, que Jesus instituiu há mais de dois mil anos. Não, quando recebemos a Eucaristia, nós alimentamos nossas almas como o novo maná, o novo pão descido do céu, que sustenta nossa vida interior, assim como o maná no Antigo Testamento sustentou a vida física dos israelitas. Ela nos fortalece para viver como cristãos fiéis num mundo hostil, certificando de que permaneceremos ligados à fonte de toda santidade e força espiritual, Jesus Cristo. Simplificando, a Eucaristia é o alimento para nossa jornada para casa, alimento que nos ajuda a sobreviver ao hostil deserto deste mundo e a chegar sãos e salvos à nossa pátria celestial.

Autor: JP Nunez

JP Nunez tem sido um “nerd em teologia” desde o ensino médio. Tem mestrado tanto em teologia quanto em filosofia (com especialização em bioética) pela Universidade Franciscana de Steubenville. Durante seu tempo em Steubenville, trabalhou por dois anos como estagiário no Centro São Paulo de Teologia Bíblica, onde suas responsabilidades incluíam responder a perguntas teológicas e ajudar a formatar e editar seus estudos bíblicos da“Jornada pelas Escrituras”.

Fonte: Catholic Exchange

Traduzido por Gabriel Dias – Membro da Rede de Missão Campus Fidei.

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