Poesia como oração

Eu participei de muitas conversas sobre oração durante meus anos como catequista. Não consigo contar o número de jovens e adultos que admitiram para mim terem dificuldade na oração. Repetidamente, eles deram a entender que realmente não sabem como orar além das declarações mecânicas que lhes foram entregues quando crianças.

No entanto, não importa se fomos batizados logo na saída da sala de parto quando bebês, ou se chegamos à fé quando adultos, fomos ensinados sobre a necessidade da oração. Assim, muitas pessoas recitam rapidamente Pai-Nossos, Ave-Marias, Glórias e bênçãos antes das refeições, sem nunca chegar a uma oração verdadeira. Então, se as pessoas devem se tornar discípulas e entrar no “drama da aliança” da revelação de Deus a nossos corações humanos, cada um de nós deve permitir ser levado às alturas da oração de maneiras que não conhecemos antes (cf CIC 2558 e 2567).

Gostaria de propor uma nova forma de crescer na oração. Bem, na verdade, não é uma nova maneira. Em vez disso, é realmente a recuperação de um método que foi testado e considerado eficaz por muitos séculos, mesmo antes do início do cristianismo. A poesia é o caminho que proponho. Ao ler e refletir sobre a poesia, podemos nos relacionar mais plenamente com o Deus que deseja profundamente se relacionar conosco e nos revelar a beleza. Podemos sondar as profundezas e escalar as alturas que Deus reservou para nós.

Essa ideia de transformar a poesia em oração tem raízes antigas, que remontam às canções de coral do teatro grego. No entanto, foi na tradição hebraica que a poesia se tornou oração de uma forma específica. Os Salmos, antigos poemas hebraicos atribuídos em sua maioria ao rei Davi, tornaram-se o livro de orações para adoração do povo judeu. Esses salmos contêm toda a gama de emoções humanas: do amor ao desespero; da alegria ao pesar; de gritos de proteção a gritos de misericórdia após um pecado grave. Meu próprio relacionamento com Deus se aprofundou por causa dessas orações; e, em muitas ocasiões, recomendei os Salmos a outros que desejaram um aprofundamento semelhante na sua relação com Deus.

A Alta Idade Média da História da Igreja também foi uma época de belos e épicos poemas. São Tomás de Aquino desenvolveu poemas que seriam cantados como hinos eucarísticos destinados a levar as pessoas a uma devoção mais profunda. Talvez igualmente significativa tenha sido a composição, no início dos anos 1300, da Divina Comédia de Dante. O poema épico, muitas vezes considerado o maior poema da história, tem muitos elementos intrigantes e místicos que levam os leitores a refletir sobre as realidades do Inferno, do sofrimento purgatório e da glória do Céu. E a Divina Comédia (qualquer um de seus três segmentos principais) proporciona uma nova compreensão a cada nova leitura. Um leitor pode permanecer extasiado em oração e meditação sobre esses conceitos por horas, dias ou semanas; e o poema convida os leitores a ler suas palavras repetidas vezes.

Ainda assim, com o passar dos séculos, há mais poesias maravilhosas que servem para nos levar a uma oração mais profunda. Thomas Stearns Eliot certa vez comentou: “Dante e Shakespeare dividem o mundo entre eles. Não há um terceiro.” No final dos anos 1500 e início dos anos 1600, William Shakespeare escreveu uma série de 154 sonetos, muitos dos quais colocaram em palavras o drama da aliança entre Deus e a humanidade. Uma jóia muitas vezes esquecida é o Soneto 62, que examina a realidade do pecado original dentro do coração de uma pessoa; e o efeito que o pecado tem na história humana.

Depois de Shakespeare, o mundo de língua inglesa continuou a produzir poesia que expressava grandes verdades espirituais. Em 1890, o poeta místico Francis Thompson escreveu um dos maiores poemas da língua inglesa. The Hound of Heaven expressa a realidade de um homem fugindo e se escondendo de Deus por muitos anos e de muitas maneiras; e a realidade da busca implacável de Deus que leva à restauração do relacionamento correto e da esperança.

No início do século XX, Gilbert Keith Chesterton proclamou a beleza e a coerência da fé católica por meio da palavra escrita. Dentro de seu magnífico corpus de comentários culturais, existem vários poemas históricos épicos, como “A Balada do Cavalo Branco” e “Lepanto”. Além desses épicos, alguns se destacam como expressões do drama da aliança da humanidade com Deus, como “O Retorno de Eva”, que é uma expressão do plano de Deus lindamente manifestado em Maria de Nazaré, a mãe de Jesus.

Do nosso lado do oceano, um dos grandes teólogos da América, o Venerável Fulton Sheen, conhecia o valor da poesia para expressar o drama da aliança da alma. Ele frequentemente citava os poemas de outras pessoas em seus escritos e pregações. Além de alguns de seus poemas favoritos de outros autores, Sheen escreveu sua própria poesia que expressava sua experiência do abraço divino. Esses poemas foram reunidos em um volume simples, publicado em 1967, chamado “That Tremendous Love”.

É até possível encontrar poesias que nos edifiquem e nos levem direto ao coração de Deus em nosso mundo atual. Por exemplo, a Revista Magnificat frequentemente inclui poemas como meditações sobre as leituras das Escrituras; a Integrated Catholic Life tem uma página chamada “Sala de Poesia Católica”; e o apostolado “Word on fire” começou a gravar Jonathan Roumie (o ator que interpreta Jesus em The Chosen) recitando poesia católica clássica. Leitores e espectadores podem explorar cada uma dessas fontes para as palavras escritas e faladas que nos levam “à adoração, à oração e ao amor de Deus…” (CIC 2502).

O objetivo de tudo isso, no entanto, não é ler ou ouvir a poesia de outras pessoas. O resultado final deve ser nossa própria poesia mística, nossa própria expressão de um drama de aliança entre Deus e cada um de nós. Publicar poemas como Dante, Shakespeare, Thompson, Chesterton ou Sheen não é o mais importante. O mais importante é encontrar o Divino e ter novas e poderosas formas de expressar nosso relacionamento com Ele. Isso permitirá que cada um de nós viva uma vida poética única com potencial para impactar o mundo.

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Autor: Derek Rotty

Derek Rotty é marido, pai, professor e escritor freelancer que mora em Jackson, Tennessee. Ele escreveu extensivamente sobre história católica, cultura, formação de fé e família. Saiba mais sobre ele e seu trabalho em www.derekrotty.com.

Fonte: Catholic Exchange

Traduzido por Lettícia Payne – Membro da Rede de Missão Campus Fidei, servindo no Núcleo de Tradução e Revisão, além de atualmente participante do Grupo de Estudo YOUFAMILY em Brasília – DF.

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