O trabalho humano

Sertillanges, filósofo e teólogo francês, diz, em seu livro “A Vida Intelectual”, que um grande pensamento pode nascer a partir de qualquer fato, e que “em toda contemplação, seja de uma mosca ou de uma nuvem que passa, há uma oportunidade de infinitas reflexões. Qualquer raio de luz pode levar ao sol; qualquer caminho aberto é um corredor que conduz a Deus. (…) Não veja numa cidade unicamente suas casas, mas a vida humana e a história”. 

Hoje proponho que apliquemos esse chamado para refletir sobre o trabalho

O trabalho é um dever, diz o Catecismo (2427). E ainda mais duras são as palavras de São Paulo: “se algum de vós não quer trabalhar, também não coma” (2Ts 3, 10). 

Mas não pensemos apenas no dever, na obrigação e no suor do rosto com o qual comeremos o pão (Gn 3, 17-19). Abramos o caminho para perceber qual é a finalidade do trabalho e em que ele contribui com o mundo em que vivemos.

Se você é um agricultor, pense em todas as pessoas que serão nutridas com os alimentos que você ajuda a produzir. Se você é um coletor de lixo, pense em todas as ruas que estarão mais belas depois que você passar, em quantas doenças serão evitadas por um saneamento bem feito. 

Quanto mais “simples” é o trabalho, mais evidente é a sua finalidade, ainda que a recompensa financeira não seja diretamente proporcional. E esse é o remédio que proponho: descubra a finalidade do seu trabalho, as razões pelas quais fazemos o que fazemos e pelas quais deixamos de fazer. 

Essas razões podem não ser tão óbvias, mas quando nos dispomos a refletir sobre elas, além de o serviço ficar mais leve, permite que pensemos em outras maneiras de chegar ao objetivo, ganhando em produtividade e eficiência. 

Sertillanges, no mesmo livro,  completa ao dizer que “As grandes descobertas são fruto da reflexão sobre fatos comuns a todos. (…) Ter sempre o pensamento atento: eis o grande segredo. O espírito do homem é um ruminante”. 

Comece entendendo que você está onde Deus o quis e busque fazer seu trabalho com amor – por mais desafiador que isso lhe pareça. 

Na verdade, sabendo que o amor se trata de uma decisão, quanto mais desafiador for o trabalho de cada um, maior é a oportunidade de se santificar. Seria ótimo se, ao invés de reclamarmos da necessidade da labuta, pudéssemos agradecer pela oportunidade de santificação. 

É mais um estranho paradoxo: por um lado, proponho que encontremos o sentido do nosso trabalho e afirmo que isso, por si só, o deixará mais leve. Por outro, digo que, quanto mais pesado for esse fardo, maior será o nosso mérito em responder com alegria ao dever diário. 

Jesus expõe um paradoxo similar nos Evangelhos: “Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de mim”. Nos pede, ainda, para alegrar e exultar nessas ocasiões. Isso está longe de ser óbvio, mas que alimente a nossa reflexão – não da mosca ou da nuvem que passa, mas do trabalho que fazemos diariamente, muitas vezes, infelizmente, “no automático”.

Texto escrito por Pedro Pagano, missionário da Rede de Missão Campus Fidei.

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