Lições de um gigante elegante.

“Jorge era o gigante mais desarrumado da cidade.” — Assim começa a história de “O gigante mais elegante da cidade”, de Julia Donaldson, um livro infantil baseado em um conto dos irmãos Grimm, um queridinho das crianças.

Descontente com a situação, Jorge, que “sempre usava o mesmo par de sandálias e a mesma camisola remendada”, se dirigiu a uma nova loja de roupas na cidade. Chegando lá, ele comprou “uma camisa elegante, uma calça elegante, um cinto elegante, uma gravata listrada elegante, umas meias elegantes com bordados nos lados e um par de sapatos brilhantes e elegantes”.

Ah, de mais desarrumado a mais elegante: “Sou o gigante mais elegante da cidade”, declarou Jorge!

Ao sair da loja, Jorge encontra em seu caminho para casa: uma girafa friorenta, um bode velejador, uma ratinha e seus filhotes sem casa, um raposo aventuroso e um cachorro no lamaçal. Cada um desses ele encontra, um a um, em uma situação de fragilidade, e a todos questiona: “O que aconteceu?”

A cada resposta, um anúncio de esperança: “Anime-se!” e despojava-se, um a um, de seus novos itens de vestimenta, doando-os conforme a necessidade daquele que encontrou em seu caminho.

Jorge entregou sua gravata listrada elegante à girafa friorenta, servindo-lhe de cachecol, e saiu caminhando e cantarolando;

entregou a sua camisa elegante ao bode velejador, que lhe serviu de nova vela para seu barco, e continuou caminhando e cantarolando;

entregou um de seus sapatos brilhantes e elegantes à ratinha e seus filhotes sem casa, tornando-se a nova casa daquela família, e teve que seguir pulando, mas sem se incomodar, e cantarolando;

entregou uma de suas meias elegantes com bordados nos lados ao raposo aventuroso, servindo-lhe de saco de dormir, e continuou pulando e cantarolando;

entregou seu cinto elegante ao cachorro no lamaçal, servindo-lhe de caminho seco e seguro para passar, e seguiu pulando e cantarolando.

A cada entrega, a música que cantou ganhava novo verso, terminando assim:

“Minha gravata esquenta uma girafa friorenta,

minha camisa até que pode servir de vela para um bode,

meu sapato é uma casinha onde mora uma ratinha,

minha meia virou cama para o raposo aventuroso,

meu cinto é um caminho legal para o cachorro cruzar o lamaçal.”

Em seu caminho para casa, Jorge andou pela cidade despojando-se de seus bens. Ele não procurou um caminho extraordinário (nem mais longo e nem um atalho), apenas seguiu seu caminho habitual e serviu aqueles que encontrou, dando de si conforme a necessidade de cada um.

A cada entrega, seguia caminhando e cantando, mas logo estava pulando e cantarolando… É certo que ele começou a pular porque estava sem um par de sapato, mas aposto que Jorge pulava também de alegria, pois quanto mais dá de si, mais alegria se encontra.

Bom, mas nem só de alegrias se faz o caminho, e Jorge, de repente, “sentiu-se triste, com frio e nem um pouco esperto ou elegante”. Voltou à loja de roupas, mas ela estava fechada. Sentou-se na calçada da loja, chorou e se sentiu tão triste quanto todos os animais que havia encontrado no caminho de casa.

Jorge experimentou então um paradoxo: sua alegria em cada entrega foi genuína, mas ele não deixou de sentir na pele a tristeza, o frio, a deselegância e cogitou-se até pouco esperto. Afinal, magnânimo, mas sem deixar de estar sujeito aos mesmos sentimentos de seus pares.

Quantas vezes no nosso caminho experimentamos o mesmo que Jorge… os santos iluminam para nós esse paradoxo: “Amar é dar até que doa.”, Santa Teresa de Calcutá; “O autêntico amor traz consigo a alegria: uma alegria que tem as suas raízes em forma de Cruz.”, São Josemaria Escrivá.

Não perdemos nossa humanidade ao tocar a magnanimidade do Amor e a magnanimidade dos atributos de Deus. Nossa humanidade, sempre ferida, necessita de cura constante em Deus, que nos trata com sabedoria, nos compreende, acolhe, acalenta… E esse acalento também se encontra nas pessoas. No Campus Fidei (minha família eclesial), chamamos isso de Vida Fraterna

Mas voltemos ao Jorge! O seu trajeto ainda não terminou, ele está nos esperando na calçada da loja.

De canto de olho, Jorge viu suas roupas antigas e as vestiu. Poderíamos nós dizer a ele dessa vez, “Anime-se!”, Jorge, você tem ao menos com o que se vestir, amanhã a loja estará aberta novamente! Com simplicidade, Jorge responde: “Sou o gigante mais satisfeito da cidade!”

Ao, enfim, chegar em casa, uma surpresa: todos os animais que ele ajudou no caminho o esperavam com uma enorme caixa de presente.

— Vamos, Jorge — eles falaram — abra logo!

De dentro da caixa Jorge tirou uma linda coroa de papel dourado e um cartão.

(Espera só um pouquinho que já transcrevo o cartão, pois ainda há mais uma lição importante aqui).

Passou pela sua mente que todos aqueles animais poderiam ter presenteado Jorge com um conjunto de vestimentas novas? Afinal, recordemos aqui: Jorge “sempre usava o mesmo par de sandálias e a mesma camisola remendada”. Ele merecia mesmo uma vestimenta mais digna!

Porém, (reflita comigo se você já experimentou isso em sua vida) nem sempre aquele que ajudamos poderá (conseguirá) nos retribuir da mesma forma. Uma retribuição que brota de um coração agradecido pode simplesmente não estar ao alcance material, intelectual ou emocional daquele a quem se ajudou e deseja retribuir, ou pode até mesmo não vir, por uma ingratidão.

São Paulo Apóstolo nos dá a resposta, que se aplica para qualquer dessas situações: “para ganharmos uma coroa imperecível.” (I Cor 9,25).

Jorge sabia disso, e expressou isso no sorriso sereno com que recebeu a bela coroa de papel dourado. Nós também devemos nos recordar dessa verdade, seja diante das alegrias, seja diante dos revezes ou ingratidões.

Mas vamos lá, não sejamos mal educados, ainda precisamos ler o (belíssimo, vocês vão ver) cartão que acompanhou o presente de Jorge:

“Sua gravata esquenta uma girafa friorenta, sua camisa até que pode servir de vela para um bode, seu sapato é uma casinha onde mora uma ratinha, sua meia virou cama para o raposo aventuroso, seu cinto é um caminho legal para o cachorro cruzar o lamaçal. Então aqui está uma coroa de verdade para combinar com as sandálias e a roupa do gigante mais AMÁVEL desta cidade.”

De mais desarrumado a mais elegante; de mais elegante a pouco esperto; de pouco esperto a mais satisfeito; por fim, o gigante mais amável da cidade, coroado de verdade, que nos ensinou que reinar é servir.

Texto escrito por Isabela Lopes, Missionária da Rede de Missão Campus Fidei .

(Deixo o link de uma versão bem contada da história para você conhecer ou reconhecer: https://www.youtube.com/watch?v=CTOvwM9efqU)

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